quarta-feira, 8 de março de 2017

Socialite, Espiã e Salvadora


por Hallie Rubenhold
A morte de uma senhora escocesa idosa, em 15 de maio de 1823, na pequena Ville d'Avray, entre Paris e Versalhes, não seria digna de nota a não ser por um detalhe: a vida de Grace Dalrymple Elliot havia sido cheia de intrigas, provações e coragem. Conviveu intimamente com lordes, duques e condes; supostamente, teve um filho do principe de Gales; salvou um marquês durante a Revolução Francesa; e (como ela afirmou) dividiu uma estadia infernal na prisão com uma futura imperatriz.
Wikipedia-Grace_Elliott
Nascida por volta de 1754, Grace foi criada na casa de seus avós maternos em Edimburgo, até a morte de sua mãe em 1765, quando foi mandada para a escola na França. Pouco depois de voltar, em 1771, casou-se com o médico John Eliot, cerca de 20 anos mais velho do que ela. O casamento, porém, não deu certo. Depois de problemas de ambos os lados, acabou quando Eliot, após descobrir as "indiscrições" de Grace com o visconde de Valencia, levou-a à Justiça sob acusação de adultério e, em 1776, obteve o divórcio e uma indenização.
A mais antiga das profissões
Em desgraça e financeiramente arruinada, Grace tornou-se cortesã.
Construiu uma vida luxuosa, apesar da precariedade, através de uma rede de relacionamentos com nobres, notavelmente o Marquês de Cholmondeley e o Principe de Gales - mais tarde, Rei George IV - do qual ela alega ter engravidado de uma menina.
Na primavera de 1779 ela começou a ir a Paris, onde conheceu Luís Felipe II, o Duque de Orleans. Na capital francesa, Grace encontrou não só um ambiente mais tolerante às suas indiscrições, como também muitos nobres ricos que poderiam financiar seu extravagante estilo de vida. Em 1786, mudou-se para Paris visando estreitar suas ligações com Orleans. É claro que ela não conseguiu perceber a iminente derrocada do antigo regime e seus excessos.
Três anos depois, os revolucionários tomaram a Bastilha. Durante o período de tumultos, Grace permaneceu em Paris ao lado de Luís Felipe (agora um jacobino), apesar de sua simpatia pela realeza. E em setembro de 1792 estava totalmente envolvida no conflito. Naquele mês, os jacobinos invadiram as prisões para matar supostos contrarrevolucionários e aristocratas. Grace foi solicitada a ajudar o Marquês de Champcenetz, um ex-camareiro do rei e governador do Palácio das Tulherias, a fugir de Paris. Um mês antes, ele havia sido gravemente ferido durante a invasão do palácio e estava sendo escondido por uma amiga de Grace. Logo que os revolucionários começaram a fazer buscas por nobres nas casas de Paris, a cortesã ofereceu sua casa de campo para esconder Champcenetz.
Depois de acomodá-lo em sua carruagem, ela descobriu que as saídas da cidade estavam fechadas. Então abandonou o veículo e levou o marquês febril para sua casa, carregando-o pelas ruas ocupadas por soldados. Sabendo que seus criados eram partidários da revolução, ela escondeu o fugitivo em seu quarto, dentro do colchão, enquanto os guardas vasculhavam a casa. Dias depois ela conseguiu levá-lo para sua casa de campo e de lá, em janeiro de 1793, para a Inglaterra.
Amazing Women in History.
Este foi um dos muitos incidentes registrados em suas memórias, publicadas postumamente em 1859 com o título Minha Vida Durante a Revolução Francesa. As autoridades francesas suspeitavam de Grace, e por um bom motivo: ela agiu como espiã para os britânicos, passou correspondências entre os émigrés e os contrarrevolucionários, e pode ter ajudado a levar cartas de Maria Antonieta para a Áustria. Mas foram suas relações com o duque que a levaram ao Comitê de Segurança Pública de Robespierre.
Conforme a revolução se radicalizava, até mesmo o jacobino Duque de Orleans e seus seguidores se tornaram suspeitos. Entre a primavera de 1793 e o verão de 1794, Grace afirma que foi interrogada e presa diversas vezes. 
Quando esteve na prisão de Récollets, em Versalhes, no outono de 1793, soube da morte de Maria Antonieta e do Duque de Orleans. Então, em janeiro de 1794, foi levada para a prisão de Carmes onde, segundo conta, dividiu uma cela com Josefina de Beauharnais, mais tarde esposa de Napoleão e imperatriz da França.
Censura
Como Grace conseguiu manter sua cabeça durante o Terror não se sabe: o úItimo capítulo de seu diário foi censurado. Depois de ser libertada, ela dividia seu tempo entre Londres e a França. Morreu em 1823 enquanto visitava a casa o prefeito de Ville d'Avray.
O diário de Grace é um dos melhores relatos de primeira mão sobre a Revoluçao em língua inglesa. Desde sua publicação em 1859, muitos questionam a veracidade do relato, parcialmente devido às suas escandalosas revelações. Mas, apesar de haver imprecisões em suas memórias, não há dúvida de que foi uma mulher notável que teve uma vida turbulenta e fascinante, em uma era turbulenta e fascinante.
Hallie Rubenhold é historiadora e escritora
Fonte:   BBC History Brasil 


Nenhum comentário: