segunda-feira, 16 de julho de 2012

Esvaziado, Itamaraty Passa por Teste de Fogo

por Luciana Coelho, de Washington e
Natuza Nery, de Brasília.
A crise no Mercosul, com a sucessão no Paraguai e a entrada da Venezuela no bloco, lançou a diplomacia brasileira e o chanceler Antonio Patriota em seu primeiro grande teste como líder regional.
O desafio será a falta de sincronia entre o Itamaraty e a presidente Dilma Rousseff. Observadores privilegiados da "corte" em Brasília, Washington e Genebra ouvidos pela Folha e que pediram reserva do nome diagnosticam: a Chancelaria não se adequou ao estilo da presidente.
Desde que ela assumiu, ocorre um esvaziamento da posição brasileira em fóruns internacionais e em debates sobre temas relevantes, frustrando ambas as partes.
Uma autoridade graduada de uma organização internacional avalia que houve um momento em que a política externa brasileira, no governo Lula e no governo FHC, "era melhor do que o país". Hoje, entretanto, o país é melhor que a política externa, o que faz o Brasil jogar numa "liga inferior à sua".
Dilma gosta de deixar claro que ela e os diplomatas não falam a mesma língua (neste ano, ela faltou ao almoço dos formandos do Instituto Rio Branco e evitou a foto com eles). A relação com Patriota reflete isso.
Ao assumir, a presidente mostrou que queria uma "diplomacia de resultados". Os diplomatas são sua antítese na mesa de negociação: enquanto ela é dura, eles sempre buscam o consenso.
Patriota está fazendo — segundo um diplomata familiarizado com a dinâmica entre os dois — o que ele acha que a presidente quer que ele faça, o que "está errado".
O chanceler não é o único a levar broncas públicas de Dilma, mas seu estilo reservado fez dele alvo recorrente.
Quando o Brasil emitiu nota sobre os ataques na Líbia, por exemplo, interlocutores contam que Dilma ficou furiosa e exigiu que todos os posicionamentos do Itamaraty lhe fossem submetidos.
Em visita aos EUA, em abril, Dilma desmarcou a entrevista de Patriota com jornalistas americanos. O episódio ilustra sua política externa: a visita ficou quase imperceptível na imprensa local.
Centralização
Como em outras áreas, a presidente concentrou em si as decisões. Mas, fora do país, são crescentes as críticas de que Dilma tem pouco apreço por temas externos e isso começa a reduzir a projeção do Brasil. Por outro lado, nenhum de seus movimentos foi considerado desastroso, e o peso econômico do país garante alguma voz a Brasília.
"Já sabíamos que ia encolher, mas encolheu demais", diz um diplomata. Para outro, o país começa a voltar, politicamente, à "periferia".
Nas entrevistas para esta reportagem, as frentes diplomáticas que emergiram pouco têm de política externa.
É o caso da "guerra cambial", bandeira emprestada da economia e usada em fóruns mundiais, e do programa Ciência Sem Fronteira, que Dilma pôs no topo de sua agenda na visita aos EUA, mas que ainda engatinha.
A outra frente é negativa: a rusga com a Organização dos Estados Americanos após esta pedir a suspensão da construção da usina de Belo Monte, que culminou na retirada do embaixador brasileiro da OEA, Ruy Casaes.
De acordo com uma pessoa envolvida no episódio, a presidente tinha razão em reclamar, mas a reação foi considerada exagerada e atraiu mais atenção para o tema.
Recentemente, Dilma avaliou positivamente o resultado da Rio +20. O timing escolhido, porém, contribuiu para a ausência de nomes de peso como Barack Obama, David Cameron e Angela Merkel, mais preocupados com agendas domésticas ou a crise.
A predileção da presidente pela agenda econômica acabou deixando o protagonismo na política externa com o Planalto, com o assessor Marco Aurélio Garcia reemergindo, e com a Fazenda.
Hoje, é a equipe do ministro da Fazenda, Guido Mantega, quando não ela mesma, que escreve os pontos de negociação da presidente, com os diplomatas informados tardiamente das decisões.
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